Especialista mostra dados e alerta: é preciso buscar ajuda
“O maior medo dos trabalhadores é o de perder o emprego. Já o dos policiais é o de perder o seu único bem precioso, a vida”. A análise foi feita pelo psiquiatra Miguel Ximenes de Rezende e, apesar de parecer simples, é suficiente para explicar porque cada vez mais policiais civis estão interrompendo a sua própria caminhada.
Palestra
O especialista esteve na Câmara Municipal de Santos na noite desta sexta-feira para apresentar a palestra “Prevenção e Posvenção ao suicídio”. O encontro contou com o apoio do Sinpolsan, que aproveitou a campanha Setembro Amarelo para alertar a categoria e, sobretudo, amigos e familiares, pessoas consideradas fundamentais no processo de identificação da doença e tratamento do indivíduo.
Foram cerca de duas horas de explanação, muitas descobertas e inúmeras constatações. Uma delas é a de que os brasileiros, ou mais especificamente os latinos, são muito resistentes a busca de ajuda na esfera psíquica.
“O psiquiatra ainda tem o estigma de ser médico de louco. Isso precisa acabar, pois a demora no diagnóstico do problema mental pode levar ao agravamento do caso”, destacou Ximenes, incluindo nesse cenário os profissionais de segurança que, ao serem preparados para garantir a integridade física e mental da sociedade, acabam não assumindo fraquezas, mesmo que já tenham chegado ao seu limite.
“O policial que está na linha de tiro deveria ter acompanhamento preventivo. Deveria fazer parte da sua função a assistência psicológica, pois é uma carreira que vive sob intensa pressão e estresse. A depressão está diretamente ligada ao modo de vida. Os policiais são profissionais que se expõem a riscos diariamente e não ganham suficiente para isso. Eles sabem que podem sair para uma ocorrência e não voltar”, disse o também presidente do Departamento de Psiquiatria da Associação dos Médicos de Santos.
Números
Além dos profissionais de segurança, jovens com idade inferior a 21 anos e idosos com mais de 70 anos integram estatísticas alarmantes. Nos últimos dez anos, aumentou em 30% o número de suicídios entre os adolescentes.
O motivo? Ximenes é direto: falta de amor. “Acabaram as refeições juntos para bater papo, os pais sentam com um celular ao lado de cada um e o filho com dois”, destaca.
Quando se trata dos idosos, o incremento na quantidade de suicídios foi de 20% na última década. Já a causa não é muito diferente. “Eles sofrem de rejeição”. Em relação àqueles com idade entre 30 e 45 anos, o quadro é estável.
No entanto, seja qual for a faixa etária, é preciso abordar o tema e conscientizar. Pensando nisso, o psiquiatra defende o Setembro Amarelo de janeiro a dezembro.
“O Setembro Amarelo é um trabalho de formiguinha que vai ter reflexo daqui uns dez anos. No próximo dia 8 de outubro, vai ter uma reunião no Rio para falarmos sobre como trabalhar o suicídio de forma frequente”, mencionou o médico. Enquanto isso não acontece, é importante que todos recebam informações, ainda que esporadicamente, e fiquem atentos a comportamentos incomuns de pessoas próximas.
Sinais
Para ajudar a detectar uma possível suscetibilidade ao suicídio, Ximenes apontou dez sinais de alerta, que podem salvar vidas. São eles: falar em suicídio, procurar modelos letais, atenção com a morte, falta de esperança no futuro, aversão a si, organização de detalhes (testamentos, doação de posses), despedidas, afastamento, comportamento auto-depressivo e estado repentino de calma.
“A melhor forma de prevenir é tentar identificar no suicida em potencial, que ele está tendo alguma alteração e o mais rápido possível levar para avaliação médica”, orientou o especialista, que ainda trata da chamada posvenção.
A palavra está ligada aos cuidados a serem tomados com a família de quem tentou suicídio e conseguiu tirar a própria vida, e com os parentes de quem não conseguiu consumar o ato.
De acordo com Miguel Ximenes, o tratamento oferecido aos familiares do indivíduo que tentou e não conseguiu é composto por uma abordagem mais intensa e direta, pois aumenta em dez vezes a chance do paciente tentar de novo.
“Eles precisam estar mais fortes para quando a pessoa voltar ao convívio”, ressaltou o psiquiatra, lembrando que o doente passará pelas internações clínica e psiquiátrica. Nesse período, a família precisará de intervenção psicológica e medicamentosa.
Para aqueles que perderam um ente querido vitima de suicídio, a atuação do médico será para ajudar na superação do trauma. “Por isso costumo dizer que palestras como essa são mais voltadas a amigos e familiares, pois eles costumam ser figuras imprescindíveis para evitar que o pior aconteça”, finaliza o especialista.